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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Relembrando uma de minhas aventuras no Amazonas


Mata... mata... mata... rio... mata... mata... rio... Ah gente?
Tem certeza que tem gente aí?
Essa foi a pergunta imediata que fiz ao piloto Paulo Bachmann depois de sobrevoarmos quase uma hora mata adentro com o Caravan Anfíbio 208. Chegamos à Região de Borba, mais precisamente em Axinim, margens do Rio Madeira na Amazônia. Uma comunidade de quase 2000 pessoas. É incrível, mas ali, onde ninguém imagina existe vida. E é por essas vidas “esquecidas” que voluntários de Asas do Socorro têm dedicado seu tempo e seu talento. Nossa equipe era composta de duas dentistas, uma médica, uma auxiliar de enfermagem, uma missionária e eu. Só mulher. E pra nossa surpresa a equipe foi acrescentada de mais seis mulheres que vieram da secretaria de saúde de Borba, o município responsável pela comunidade de Axinim.
Quando o avião amerissou muita gente já nos aguardava. A alegria expressa nos olhos deles era incrível. Como se dissessem alguém está olhando por nós. Segundo Bachmann, a população ribeirinha, ou caboclos é a que mais sofre por falta de assistência. Eles não são considerados nem índios, nem brancos e por isso não são assistidos como os índios. “É um povo que não tem nada e o grande desafio é o casamento da tecnologia do século 20, como um avião (pássaro grande de barriga), como dizem, com um povo que vive ainda como a 500 anos”, explica o piloto que há 15 anos trabalha com Asas. Para ele só mesmo a mão de Deus para fazê-los encontrar gente onde ninguém imagina. “Deus orquestra tudo. Manda chuva justamente quando temos que cancelar um vôo. Dá-nos sabedoria para descobrir rapidamente as eventuais panes do avião, entre outras coisas que posso chamar de milagres”, acrescenta o piloto. Os lugares que eles pousam, às vezes, levam-se dias para chegar de barco e numa emergência, o tempo é vida.
Mas, vamos continuar nossa aventura. Assim que desembarcamos em Axinim, a equipe já começou a montar os “consultórios” e a primeira frase que ouvi de um morador foi: “Vocês caíram do céu”, tal era a ansiedade deles por ajuda. O lugar tinha mais estrutura do que as situações normais que as equipes de Asas enfrentam. “Nossos equipamentos são adaptados para regiões precárias mesmo; como cadeiras de plástico dobrável; gerador de energia solar para funcionamento do compressor; nossas camas são redes e o que trazemos na bagagem é muito amor por esse povo”, explica a missionária Mara Jeane Dantas.
A fila de espera para atendimento num instante ficou enorme. E eu pra aproveitar a ocasião, entrevistei alguns nativos, como o pescador Valdenor Rodrigues que disse estar muito feliz: “Essa atitude de vocês traz pra nós carinho, alegria, não só ajuda médica, mas conforto espiritual também”. Para o aposentado Orlando Moraes, os voluntários deveriam vir mais vezes. “É mais fácil vocês chegarem de avião até nós, do que a gente ir a remo 18 horas rio adentro pra conseguir socorro médico”, disse. Já a dona Eugênia Moreira de Lima, 70 anos, só queria saber de curar a dor que estava sentindo por dentro. Quanto mais eu perguntava o que ela estava achando do projeto, mais ela me respondia: “É só essa dor mesmo que sinto por dentro e as minhas vistas que não estão boas”.
Depois de ter conhecido um pouco do povo; tirar bastantes fotos, me encarreguei de brincar com as crianças e não demorou muito; eu já contava mais de quarenta delas ao meu redor.
Umas me olhavam profundamente sem nada dizer, mas expressando um carinho intenso por alguém que “veio do céu”. “Tia nós vamos brincar” diziam outras. E eu botei pra quebrar. Brincamos tanto, que no outro dia, mal abriu a clínica e as crianças estavam todas lá novamente esperando as novidades do dia. Dentre as atividades, os “curumins” , como se tratam, aprenderam sobre a importância de se escovar os dentes. Entregamos escovas e pasta pra todo mundo e a tia Angélica (dentista de Borba) ensinou como se faz para deixar os dentes limpinhos. Pois é, o que pra gente é tão banal, tão corriqueiro, como escovar os dentes, para aqueles curumins era uma novidade e olhando tudo aquilo eu pensava o quanto tem gente precisando de ajuda nesse país.
Foram quatro dias de muito trabalho ali em Axinim, mas quatro dias de uma experiência imensurável. Sem contar que tomei banho de canequinha; dormi em rede; comi cacau, ingá e outras frutinhas mais. A Asas de Socorro tem muita história pra contar e muito trabalho pra realizar nos lugares mais remotos desse país. Mas, por ser uma ONG conta com a nossa colaboração seja em orações, voluntariado ou mesmo ajuda financeira. Se você tiver interessado em saber mais ou quem sabe também investir nesse projeto. Acesse o site: http://www.asasdesocorro.org.br/ ou contribua para o sustento dessa obra pela conta