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sexta-feira, 2 de outubro de 2009

A visão do assento 7B


Texto que meu amigo Fernando fez pra mim.

Confesso que até a bem pouco tempo nunca dei bola às aeromoças - acho que sou uma exceção entre os fetichistas - elas pareciam uma parte menor naquele mundo dos aeroportos, viagens aéreas, gente falando um monte de idiomas e viajando pra lugares que nunca sonhei existirem.

Aeromoças, comissários e pilotos ocupavam um espaço restrito e bem catalogado em meus arquivos: no arquivo “a”, aeromoças se resumiam a uma admirável estampa pré-fabricada, com os cabelos irritantemente bem arrumados, uniformes impecáveis e adereços igualmente arrumados e padronizados. Isso para não citar a maquiagem, engomadíssima. Parecia uma mulher feita em massa – muito bem feitas, mas idênticas entre si. Tão produzidas e de bom gosto que pareciam anular as qualidades fundamentais das mulheres: as diferenças individuais.

E iguais não só no visual, também no comportamento. Sejam as que atendem as viagens nacionais ou as internacionais (tudo bem, neste tema não sou lá um especialista, mas tenho lá algumas milhas), sempre vi meninas sorridentes e com aqueles irritantes cabelos padronizados ocupando o espaço certo dentro do corte perfeito e do uniforme milimetricamente cortado. Sempre tive a impressão que primeiro faziam o uniforme depois achavam uma mulher (e um sorriso) que entrasse perfeitamente nele.

Com os comissários, a situação seria bem semelhante, com a diferença que sua alma deveria ser a mesma de uma aeromoça: feminina, alegre e sorridente. E até seria fácil de se adequarem, já que seriam aeromoças teoricamente mais sorridentes, já que por serem catalogado como do gênero masculino, os comissários não têm TPM.

Quanto ao resto do pessoal de bordo, aqueles outros sujeitos que entram na cabine, não sei. Mas para ser comandante, o sujeito deveria ter um bom sotaque carioca – sempre – e falar um monte de coisas técnicas com ar blasée pelo sistema de auto-falantes do avião. Nunca soube exatamente o que falavam, mas a tradução para o seu carioquês nativo seria algo do tipo: “Aí, meux irrrmãos, tamox voando a uma caralhada de péx de altura a uma velocidade absurrrda. A temperatura lá fora é muuuiito frria e eu tou aqui pilotando com os doix péx no manche só pra sacanearrr”.

Tudo bem, o comandante deveria ter lá seus momentos de stress, mas nunca vi um que tivesse qualquer sinal de cansaço depois de muitas horas pilotando. Ali, na saída do vôo, sempre estava lá em pé com o maior dos piques se despedindo dos passageiros. Talvez por ser um dos poucos trabalhadores a bordo que não tiveram de fazer aquelas mímicas terríveis para explicar onde estão as saídas de emergência e como é que iriam cair as tais das máscaras de oxigênio que deveríamos colocar no rosto com elásticos (elásticos, aliás, que as aeromoças nunca colocam nas cabeças para não estragarem os minuciosos penteados padronizados).

Bom, tudo isso é como eu via o mundo dos que trabalham dentro do avião. E olha que eu comecei a viajar naquele tempo em que a gente ia apertadinha dentro de um Electra e que as comissárias (acho que só existiam comissárias do sexo feminino naquele tempo) se ocupavam de encher a barriga dos passageiros com mil pratinhos, lanchinhos e sobremesas. Isso mudou, assim como minha visão das comissárias. Acho que o que as humanizou foi uma que um dia deixou cair um pouco de refrigerante em minha camisa. Acho que foi a primeira vez que falei com uma sem que ela sorrisse com aquela cara de Barbie. Pegou paninhos, papéis e mais paninhos até que eu estivesse quase completamente seco. Ela pode ter visto aquilo como um terrível acidente aéreo, mas eu vi como a quebra de um paradigma. Soube que ali havia alguém que se preocupava com outra pessoa e não só uma boneca linda e sorridente a repetir protocolos e procedimentos padrão. Eu juro que até vi alguns fios de cabelo escaparem do indefectível penteado.

Bom, isso foi até conhecer a Lu Tonon. Essa, apesar de já a ter visto “montada” de comissária (e nunca do banco de passageiros, o que é uma pena), acho impossível de ver como alguém presa a procedimentos programados. Cortesia em seu caso é parte do temperamento. Ela não precisa ler nenhum manual para ser simpática e inteligente. Mesmo fazendo a coreografia das saídas de emergência. E olha que a dancinha é bem ridícula.

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